Abletes, barbos e o desígnio da Nação

... para pescadores, caçadores e outros mentirosos
Responder

O Sítio do Pescador

Pesquisa respostas acerca de
"Abletes, barbos e o desígnio da Nação"
na nova versão do site.

JMET
Mensagens: 69
Registado: quinta fev 17, 2011 11:48 am

Abletes, barbos e o desígnio da Nação

Mensagem por JMET »

No Verão do ano passado, os meus amigos caçadores - e pescadores quando a caça está interdita - convidaram-me para nova pescaria, no mesmo local recôndito do Sorraia.
“Vai ser outra bela pescaria e uma almoçarada das antigas”, disse-me o Antunes, de novo o organizador da expedição.

Como no ano anterior, ele, o Matos e o Batista entretiveram-se a apanhar abletes. E eu dediquei-me aos barbos, à inglesa.
Depois, veio o inevitável pic-nic.

O Matos levou novamente o vinho, da colheita pai, da zona do Cartaxo. A mesa foi igualmente farta e o vinho arrancou as costumadas exclamações de agrado.

À semelhança do ano anterior, o Antunes, quando topou que o Batista tinha a sua garrafa quase vazia, começou a espicaçar-lhe a veia poética.
O Batista, como de costume, fez que resistia, mas acabou por declarar:

- Bom, então lá vai...

Voltei a sacar do mini-gravador que me acompanha sempre e registei o seguinte, que aqui partilho convosco.

Disse o Batista, erguendo-se e modulando a voz:

- Correspondendo aos pedidos insistentes dos meus amigos, e pela muita consideração que tenho por vós, de minha autoria, vou recitar mais um tributo ao irresistível néctar:


Ah!, se todos fossem como o avô...

Quando penso em vinho penso no avô
homem do campo arrostando com o sol
parcimonioso, assim como eu sou
afoito na vida e moderado c’o briol

Apenas bebia em ocasiões particulares
Ao matar de bicho matinal
ao chegar cedo aos pomares
a meio da manhã, nalgum pinhal

Bebia bem ao almoço, lá p’rás treze
à tarde nem tanto, nada disso
só para matar a sede, várias vezes
e outras com uns nacos de chouriço

De regresso ao lar nada de excessos
Uma breve paragem na taberna
sorvendo de passagem três canecos
e ala que se faz tarde pela berma

Na ceia farta - janta de trabalhador -
permitia-se uma certa relaxação
Comia bem, quase com amor
e despejava à vontade meio garrafão

Depois falava e era eloquente
Lembrando que o vinho era dádiva de Deus
sorvia uns copinhos de aguardente
e vituperava bêbados e ateus

Por fim ia recuperar de toda a canseira
tropegamente à avó dando a mão
sabendo consolado que à cabeceira
repousava bem cheio um canjirão

Ah!, se todos fossem como o avô...
cumpria-se o velho desígnio da Nação
embora doendo a quem calhou
matava-se bem a fome a um milhão


De novo, o Batista foi aplaudido de pé.
E todos concordaram que o avô do Batista, afinal, não diferia muito dos do restante pessoal.

Outros tempos...
Avatar do Utilizador
Beto_Manja
Mensagens: 562
Registado: segunda out 12, 2009 1:21 pm

Re: Abletes, barbos e o desígnio da Nação

Mensagem por Beto_Manja »

Boas,

Mais um belo texto.
Merece uma ovação de pé esse poeta!
Previlegio de quem testemunha esses momentos...
Parabens e obrigado pela partilha! :fixe:

Cumprimentos,
Roberto
Responder