Sei que este texto vai ser longo, mas só assim consigo contar esta história.
Como hoje estou numa de escrever, aqui vai uma história para vos meter a pensar no que é realmente ser um "bom pescador".
Tenho 23 anos. Pesco a sério desde os meus 14. Não é muito mas chega para ter visto muitas histórias insólitas na pesca, algumas delas em que parti o côco a rir. Vou tentar relatar o melhor que posso uma delas.
Como vocês sabem existem pescadores melhores, outros piores, outros mais modernos e outros mais antiquados. De entre os pescadores mais "modernos" e com mais teórica (ou pensam que sabem muita teórica) são os "pescadores dos fóruns de pesca". Atenção que não quero, com esta história, denegrir a imagem dos fóruns de pesca, nem nada que se pareça. Estes são aqueles "pescadores" que assimilam (ou tentam assimilar) tudo o que envolve a pesca através dos fóruns e apenas lendo o que lá se encontra, pensam que estão prontos para fazer aí grandes pescarias regularmente.
Pois bem, aqui na minha zona mora um senhor de nome Osvaldo. A malta da zona chama-lhe o "velho da Vespa". Quando esta história se passou ele tinha 66 anos, portanto agora ele tem os seus 68 ou 69. É daqueles que pesca à antiga: fios 0.50's nos seus Daiwa GS9 e BG90, Canelon de 5.20m, chumbada artesanal feita por ele (sempre de 140gr para cima), anzóis nº 1 para cima, nada de destorcedores e estralho tudo acima de 0,35. O normal é pescar com 0,40/0,45 pois diz que o 0,35 é para pescas maricas quando mar está manso e "luso". Ele provavelmente nem faz ideia do que é Internet, quanto mais fóruns de pesca. E agora muitos de vocês já devem estar a pensar que o Sr. Osvaldo não deve apanhar muito peixe porque esta forma de pescar já é do século passado...
Um certo dia estava eu à pesca desde as 6:30h da manhã num pesqueiro da zona Norte de Magoito (Sintra) ao spinning. É um pesqueiro a partir de pedra em que o fundo é pedra ou misto com muitos "balcões". O mar estava bom para qualquer pesca, azulinho e bem oxigenado. Passado 20min aparece o velhote da Vespa lá no alto da arriba e ele, já me conhecendo, acenou-me e perguntou-me se tinha alguma coisa. Fiz sinal a dizer que não. Entretanto ele com a sua calma e com o seu Canelon lá desceu a arriba e veio ter comigo. 10min de conversa e diz-me que ía experimentar meter uma chumbada numa coroa uns 200m mais a sul. Ele lá foi e eu fui quase atrás dele pois ali onde eu estava não sentia nada. Entretanto no alto da arriba vejo dois rapazes novos (tinham os dois 30-35 anos) a descer cá para baixo. Estes vêem-se colocar ao lado do velhote. Vão-lhe perguntar se já tinha alguma coisa, ao qual o Sr. Osvaldo disse que não e que tinha chegado á 5min, e começam a olhar para o material do homem com muito espanto. Começaram-lhe a perguntar porque é qua ainda usava aquela cana, aquele carreto e aquele material "pesadão". Ele, como pessoa reservada que é, fez tipo um "
" e eles começaram-se a rir e gozar com o homem. Tiveram ali uns 5min a rir-se dele e a tentar convencê-lo que hoje em dia já não se pescava assim e que assim não apanhava nada, e que tinha de ao fórum de pesca XXXX aprender umas coisas, etc, etc. E o velho manteve-se calado. Eu que já conheço o homem de "gingeira", fiquei a rir-me entre dentes e já a suspeitar o que iria acontecer a seguir. Eles, lá montaram o material deles todo xpto e começaram a pescar.Bem, o que é certo é que naquela manhã o Sr. Osvaldo enche a alcofa dele com robalos e sargos (se bem me lembro, tinha 7 ou 8 robalos bons, de quilo até 3 quilos e uns 4 ou 5 sargos), eu apanhei 2 cachaços quileiros (não estavam a ligar muito às amostras) e os outros ficaram a chuchar no dedo, nem um para contar a história. Eles bem lançavam à direita do velho, à esquerda do velho, para cima do velho... e nada. Eu, ao longe, só me ria. No final, lá para as 11h quando o peixe começou a não picar, eles vieram perguntar ao velho como ele fazia aquilo e ele, muito rapidamente, arrumou as coisas, veio despedir-se de mim, um "bom dia" a eles os dois e foi-se embora. Os dois quase que o queriam comer
e ainda se vieram queixar a mim de o velho ter sido anitipático 
No dia a seguir, por curiosidade, fui lá ver o pesqueiro e no cimo da arriba estava o velhote a olhar lá para baixo. Ele diz-me assim: "tás a ver, Miguel. Basta um gajo apanhar uns peixitos que acontece logo isto...". Olhei para o pesqueiro do dia anterior e estavam lá 6 pescadores com umas 10 canas. No espaço duma hora e meia não vimos sair nem um peixe. Ele diz-me assim: "Isto é para quem sabe, não é para quem pensa que sabe, e quem sabe, deixa-se estar calado, bem caladinho.".
E agora perguntam vocês:
O que raio tem o velho de especial para dar um barrete daqueles aos dois gajos?
Pois bem, ele pode não ter muita técnica (ou tem a técnica dele) mas tem uma ampla experiência. Se ele acha que no dia X vai á pesca, no dia anterior pega na sua "motoira" e vai ver os pesqueiros duma ponta à outra para ver qual o melhor para ir no dia a seguir. O homem sabe ler o mar como muito poucos sabem. O homem conheçe cada buraquinho da zona onde ele pesca (e não é uma zona pequena) e sabe onde tem de meter a chumbada. Ele sabe que no pesqueiro Y e na fase de maré Z, há uma maior probabilidade de apanhar peixe. É uma pessoa que se for preciso levanta-se muito cedo e vai apanhar a bela da Tiagem (atenção que não conheço ninguém a apanhar tiagem como ele) ou outro isco qualquer na maré vazia. E nesse dia o tal pormenor que faz a diferença foi mesmo a Tiagem e o saber iscá-la. No fundo, ele sabe adequar a pesca dele às condições que ele encontra no momento. E isso é o suficiente para ele ser, na minha opinião, um "bom pescador". Poderia talvez ser melhor se usasse material mais leve, mas ele diz que pesca à 40 anos assim e que não sentiria tanta confiança no material mais recente como a que ele tem no dele.
Portanto, nesta coisa da "pesca", como em muitas mais coisas, por muita teórica que tenhamos, nada melhor do que ter muita prática e nada melhor do que ir ao mar aprender através da "tentativa-erro". A Internet ajuda e muito, mas isso só não chega. Este foi um belo exemplo disso.
Desculpem o testamento.
Cumprimentos,
Miguel Pimpão
